comunicacao não violenta como praticar - universo empático

O que é comunicação não violenta e como transformar o conflito nas relações

CNV é a sigla utilizada para denominar a Comunicação Não Violenta, a qual foi estruturada pelo psicólogo Marshall Rosenberg. Ele começou a investigar mais as relações humanas e a forma como nos comunicamos. Diante de suas investigações, Marshall estruturou a CNV em quatro pilares, como um “mapa” para uma comunicação mais efetiva entre a pessoas. Os quatro passos estruturais da CNV são: observação, sentimento, necessidade e pedido. Diante destes quatro pilares, como colocá-los em prática na vida diária? Confira a seguir!

A CNV em uma situação cotidiana

Vamos imaginar uma situação cotidiana para conseguirmos desmembrá-la e identificar cada um dos quatro passos, e em seguida nos atentarmos mais profundamente em cada um dos pilares da CNV para podermos enxergar com maior clareza como é possível aplicá-la no dia a dia. 

Imaginemos a seguinte situação: um colega de escritório de Luiz tem colocado alguns documentos novos, que ambos utilizam em suas rotinas de trabalho, em um lugar que Luiz considera inapropriado. Isto tem acontecido nos últimos cinco dias. Luiz tem se sentido irritado. Na manhã do sexto dia em que isso se repete, Luiz olha para o colega de trabalho e diz: “Você é desorganizado. Isso é irritante.” 

Nesta circunstância, conseguimos identificar que na fala de Luiz não houve uma observação, e sim uma avaliação ao dizer: “Você é desorganizado.” A observação dentro dos pilares da CNV, seria de maneira a apenas identificar e descrever o ocorrido: “Nos últimos seis dias você tem deixado os documentos novos em um local que considero inapropriado e de difícil acesso.”

Conseguimos verificar também que Luiz não comunicou o seu sentimento ao dizer “Isso é irritante”. Uma maneira que ele poderia ter utilizado para comunicar como se sente diante destas circunstâncias poderia ser: “Fico irritado quando vejo os documentos guardados neste canto do armário.”

Na fala de Luiz também não houve a comunicação de sua necessidade nem de seu pedido diante destas circunstâncias. Para dizer sua necessidade e fazer um pedido, ele poderia ter dito: “Quero que nossos documentos novos sejam guardados com segurança e que fiquem mais acessíveis (necessidade). Você estaria disposto a combinarmos um novo local para guardarmos esses documentos? (pedido)

Ampliando o olhar sobre a “observação”

Quando falamos do primeiro passo, a observação, costumamos ter o primeiro pensamento de que é algo bem simples, temos a sensação de que fazemos isto a todo momento. Será? Aqui Marshall traz a observação de uma forma um pouco diferente, em que observamos atentamente o que está acontecendo em determinado momento da maneira mais neutra possível e sem julgamentos ou avaliações. 

Nossa mente está acostumada a trazer pré-julgamentos junto com nossas observações cotidianas. Importante ressaltar que todos temos juízo de valor, e que isso é inerente ao ser humano . O julgamento é algo diferente do juízo de valor, já que afasta a possibilidade da escuta empática, desvalida o interlocutor e consequentemente suas necessidades dele. Percebe que desta maneira o diálogo se perde, já que anulamos a possibilidade de o outro existir verdadeiramente para nós com suas necessidades e desejos?

Para aplicar a observação em sua vida, é necessário começar a praticar o olhar de observador mais atento e consciente aos fatos que estão ocorrendo, com o menor julgamento ou avaliação possível. 

o que é comunicação não violenta

Identificando o “sentimento”

O segundo componente da CNV é expressar como nos sentimos. Se pararmos para analisar o número de palavras que utilizamos para rotular as outras pessoas, nos damos conta que é muito maior que nosso repertório para descrever claramente nossos estados emocionais. Em nossa sociedade aprendemos desde cedo que os sentimentos não são considerados importantes, mas que devemos nos atentar a forma considerada correta de pensar e agir. 

Vamos nos acostumando a nos direcionar para os outros, buscando nos modelar de acordo com o que acreditamos que esperam de nós “o que as outras pessoas acreditam que seja certo eu dizer ou fazer?” Acabamos não entrando em contato com nós mesmos, com nosso interior, com nossos sentimentos. Por isso, identificar um sentimento em determinada situação requer prática diária, já que muitas vezes não estamos atentos e realmente conscientes sobre nossos sentimentos. Se nós mesmos não estivermos inteirados sobre o que sentimos, fica impossível a comunicação genuína para nosso interlocutor.

Marshall ressalta que existe uma confusão em nossa linguagem no uso do verbo sentir, que costumeiramente é usado sem realmente expressar algum sentimento. Ele salienta que utilizamos o verbo sentir em muitas situações em que estamos falando sobre o que pensamos, nestas circunstâncias  o verbo sentir pode ser facilmente substituído por penso, creio ou acho: “Sinto que não fechei um contrato justo.” 

Para aplicarmos este segundo componente da Comunicação Não Violenta é necessário desenvolvermos um vocabulário de sentimentos que nos permita identificar ou nomear de forma clara e específica o que sentimos. Expressar nossos sentimentos de maneira genuína nos conecta mais facilmente uns com os outros. Quando permitimos ser vulneráveis por comunicarmos nossos sentimentos, estamos ajudando a resolver conflitos.

Entrando em contato com a “necessidade”

Neste terceiro componente da CNV está o reconhecimento das necessidades que estão por trás de nossos sentimentos. As circunstâncias que ocorrem ou o que as outras pessoas dizem podem ser o estímulo, mas não a causa do que estamos sentindo.

Pode parecer assustador revelarmos nossas necessidades em uma sociedade que nos ensina a ignorar nossas próprias necessidades para atender as necessidades das outras pessoas. Marshall diz que “todo ato violento é uma expressão trágica de uma necessidade não atendida.” O psicólogo também enfatiza que uma maneira de aumentar exponencialmente a possibilidade de atender às necessidades de todos é as pessoas começarem a falar mais sobre o que precisam em vez de falarem sobre o que está errado com os outros.

Marshall estruturou uma lista de necessidades humanas básicas que todos compartilhamos, sendo algumas delas: autonomia, interdependência, abrigo, integridade e lazer.Muito do que sentimos em nossas emoções negativas é porque alguma necessidade não está sendo atendida. Cabe a nós estarmos atentos em nossas rotinas sobre as necessidades que estão por trás do que sentimos para assim conseguirmos conectar nossos sentimentos a nossas necessidades. 

O que abre espaço para a outra pessoa agir compassivamente, já que estaremos comunicando nossa autorresponsabilidade pelo o que sentimos, que identificamos nossa necessidade por trás do nosso sentimento ao invés de culparmos a outra pessoa.

Importante também estarmos atentos sobre qual a necessidade que a pessoa com quem dialogamos está trazendo em suas falas. Desta maneira podemos verificar com ela se é mesmo a necessidade que imaginamos e criar aproximação e conexão no diálogo, já que você estará expressando abertura para compreender seus sentimentos e desejos. “Você está tentando me dizer que precisa ter mais tempo de lazer durante a semana, é isso?”

Fazendo pedidos

O quarto elemento da CNV é o pedido. Após a observação, sentimento e necessidade, chegou o momento de fazermos um pedido ao nosso interlocutor. Precisamos nos atentar na forma em que realizamos este pedido, já que muitas vezes não o expressamos com clareza. Aqui devemos evitar frases vagas, ambíguas, abstratas. Outro ponto importante é dizermos o que estamos pedindo, em vez de o que não estamos.

O pedido não é uma exigência, sendo interessante indicarmos nosso desejo de que nos atendam apenas se puderem, de livre vontade. A CNV tem como objetivo estabelecer relacionamentos baseados em honestidade e empatia, e não em conseguir o que queremos. A intenção é de que todos tenham suas necessidades atendidas. Quando escolhemos pedir não significa que devamos desistir sempre que alguém responder não à nossa solicitação, mas que estaremos com a intenção de oferecermos nossa empatia para com o que está a impedindo de dizer sim.

Ao dizermos: “Gostaria que você demonstrasse respeito por minha privacidade”, estamos sendo vagos em nosso pedido. Poderíamos dizer: “Gostaria que você concordasse em bater na porta antes de entrar em minha sala de reuniões”.

Colocando os 4 passos da CNV em ação

Diante desses quatro passos é possível exercitar a CNV, tornando nossa comunicação mais consciente e menos reativa. Com o tempo se torna uma prática e atitude natural no modo de se comunicar, a pessoa vai se apropriando cada vez mais de suas necessidades e sentimentos, conseguindo expressá-los mais genuinamente. Assim como conseguindo atuar com a observação neutra e realizando pedidos mais honestos e objetivos.

Esta forma de se comunicar, a partir dos pilares da Comunicação Não Violenta, baseia-se em habilidades de comunicação e linguagem. Quando utilizamos os quatro passos da CNV passamos a reformular nossa maneira de ouvir as outras pessoas e também de nos expressarmos com elas. Aqui começamos a abrir um campo de comunicação mais frutífero, já que estaremos atentos e conscientes ao que acontece dentro de nós e em nossa percepção sobre o outro, estaremos mais disponíveis para o real diálogo em que a compreensão mútua está sendo almejada. 

Diferente de quando iniciamos uma conversa querendo competir, querendo estar certo ou apenas jogar palavras ao vento. A possibilidade de termos respostas mais conscientes se amplia enormemente, assim como a compreensão do interlocutor do que estamos querendo expressar. Amplia as chances da comunicação acontecer com maior clareza, gerando mais aproximação e conexão em nossas relações cotidianas.

Reinaldo Duarte da Silva
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