Coaching Ontológico – O que é?

Chamamos de coaching ontológico a um processo de aprendizagem que suporte e auxílie para o atingimento de um objetivo específico, seja uma tomada de decisão, uma mudança de comportamento, uma meta profissional ou outra coisa que se queira transformar em si ou para si. 

Existem muitas modalidades de coaching e uma delas é o coaching ontológico, que está baseada na Ontologia da Linguagem, metodologia desenvolvida a partir das teorias de alguns pensadores chilenos como Humberto Maturana, Fernando Flores e Rafael Echeverria. 

Os proponentes do coaching ontológico acreditam que, como somos pessoas que significam a si mesmas e ao mundo por meio das distinções que fazemos, faz todo sentido que esse seja o ponto de partida para a transformação: a linguagem

Quando investigamos, refletimos e ampliamos a forma de pensar e falar criamos um novo mundo, infinito em suas possibilidades.

O QUE DIFERENCIA O COACHING ONTOLÓGICO DOS OUTROS?

Primeiramente vale destacar que muitas modalidades de coaching são sérias e alcançam resultados importantes. A principal diferença que o coaching ontológico apresenta é a proposta de alterarmos a forma de observar o mundo, conseguindo assim alterar os resultados das ações.

Algumas linhas de coaching identificam em seus clientes habilidades e ferramentas a desenvolver com um olhar para fora, para o mercado onde se atua ou se deseja atuar. O coaching ontológico sugere uma reflexão para si, sem o contorno limitante que o mundo impõe como rótulo do que e como se deve ser.

Assim, o tripé do coaching ontológico é formado pela consciência, responsabilidade e aprendizagem. Três pilares que reconstroem a forma de enxergar as diversas situações da vida, ao ampliar a consciência de si, ao redirecionar para si a responsabilidade sobre as questões e ao gerar aprendizado, que é a capacidade de fazer diferente.

O manifesto do coaching ontológico é despertar o desejo de uma auto-construção do indivíduo, fortalecendo-o como ser genuíno e autônomo, criativo e que busca o bem-estar.

OS POSTULADOS DO COACHING ONTOLÓGICO:

  1. Interpretamos que os seres humanos também são seres linguísticos. Reconhecemos a linguagem como elemento central na natureza do ser humano agregada às dimensões biológica e psicológica. Esses três domínios, corpo, emoção e linguagem, estão coerentemente interligados. 
  2. Interpretamos que a linguagem, além de descritiva, é também geradora. Podemos mesmo postular a prioridade da natureza linguística sobre a biológica e a psicológica, pois é por meio dela que conferimos significado à nossa existência, dando sentido aos domínios do corpo e da emoção. Assim, a linguagem não apenas fala das coisas. A linguagem gera o ser humano e cria realidades. Distintos mundos emergem conforme a maneira como operamos na linguagem, que é talvez o fator mais importante na definição da forma como nos vemos a nós mesmos ou somos vistos pelos outros.
  3. Interpretamos que os seres humanos se criam a si mesmos, na linguagem e através dela. Nossa cultura tradicional admite que cada indivíduo nasce dotado de uma forma de ser particular e imutável. A vida seria assim meramente o espaço em que essa natureza inata se revelaria.  A ontologia da linguagem assume uma posição radicalmente contrária, defendendo que a vida é o espaço em que os indivíduos criam a si mesmos. Nada é de uma forma determinada, que não permita infinitas modificações. Essa interpretação nos permite ganhar domínio sobre nossas próprias vidas, nos auto-implicando em sua construção. Esta é a proposta que nos apresenta a ontologia da linguagem.

 

Texto colaborativo escrito por: Káritas Ribas, Ana Gomes, Karla Teixeira e Iuri Barroso

Coaching Ontológico: Por que Ontológico?

Coaching Ontológico, nome e sobrenome cujos desafios para a explicação, em poucas palavras, se impõe rotineiramente, especialmente pelo fato de envolver conceitos filosóficos que, se tratados com superficialidade, podem facilmente cair na armadilha da hiper-simplificação, tão comum ao pensamento disjuntivo (ou linear).

À moda de Deleuze, filósofo francês contemporâneo, declaro com antecedência que roubarei conceitos. Valho-me de pensamentos, textos, artigos e fragmentos de muitos autores e nesse sentido, Deleuze insiste e autoriza: o roubo (de conceitos) é criativo, pois, ao nos apropriamos deles, os modificamos e os fazemos nossos.

COACHING ONTOLÓGICO

Falo, portanto, do “meu” Coaching Ontológico, daquele que me atravessa e que produzo diariamente em meu fazer profissional. Falo desse ritmo que tenho dançado há tantos anos e que, a cada dia, torna-se mais vivo e cheio de sentido, que ganha mais corpo e permite expandir os limites do meu mundo.

Minha pretensão não é pequena: é a de fazer com que cada leitor se apaixone pelo Coaching Ontológico ou, pelo menos, seja tocado por ele, pela beleza dessa profissão, cujo cerne é o amor em seu sentido menos usual, isto é, aquele que aceita o outro como verdadeiro outro na convivência.

SOBRE A ONTOLOGIA

A busca pela compreensão do homem enquanto tal gera inquietação e curiosidade no próprio homem desde tempos imemoriais. Saber de sua essência, do que o constitui e o diferencia incentiva estudos científicos e filosóficos.

Os gregos antigos, que cunharam o termo ontologia, fizeram-no para dar conta da compreensão do ser como tal, do entendimento sobre a existência de algo e da busca de seu fundamento. Esse conceito, na Grécia antiga, confunde-se com a metafísica[1] e procura categorizar a essência de uma entidade. A ontologia foi chamada de ciência do ser enquanto ser e sua pergunta fundamental é “o que é?”. Em outras palavras, quando alguém se pergunta “o que é o ser humano?”, está formulando uma pergunta ontológica.

Distintamente da metafísica, que é entendida como ciência para além da física, faremos o uso do conceito de ontologia num sentido particular e, para isso, nos apoiaremos no filósofo alemão Martin Heidegger. Sua filosofia se debruça sobre o modo particular de sermos seres humanos, ou seja, faz referência à forma como interpretamos e significamos o que é e o que nos é possível enquanto seres humanos. Em seu livro Ontologia da Linguagem, Rafael Echeverria nos oferece um exemplo:

Quando dizemos “a maça é vermelha” estamos supondo que, como ser humano que somos, podemos determinar de que cor é a maça. Toda ação, todo dizer, pressupõe um juízo sobre o que, como seres humanos, nos é possível. (ECHEVERRÍA, 2011, p.29)

Dessa forma, cada vez que se dizemos algo, cada vez que atuamos no mundo, manifestamo-nos como seres humanos que somos, que, além de agirem sobre um objeto, expressam sua ontologia nesse sentido que queremos conferir. Nos dias atuais, nos aproximamos das coisas e as percebemos a partir da sua utilidade, do questionamento de sua função e serventia. Heidegger faz uma severa crítica ao esquecimento do ser, à sua objetificação e identificação com qualquer outro ente e à consideração dele como mais um recurso disponível. Não precisamos, apesar disso, fazer uma oposição isoladora ao ente como recurso, ao seu modo de operar, ao seu fazer.

O homem é um ser histórico, que age e pensa em sintonia e em articulação com o mundo, que confere sentido e o interpreta a partir de sua historicidade. Suas possibilidades de ser são historicamente constituídas e, simultaneamente à perspectiva histórica, ele tem a possibilidade da criação. Deste modo, o novo está disponível ao homem a cada momento, pois ao conferir sentido ao mundo, ele cria realidades.

Nesse ponto, o conceito de autopoiese, cunhado por Humberto Maturana e Francisco Varela, e sua dimensão filosófica, desenvolvida por Gilles Deleuze e Felix Guattari, ajudam a pensar uma nova abordagem para a ontologia. Podemos olhar para o homem como um processo de autocriação permanente, não mais no sentido de reprodução histórica exclusivamente, como o evolucionismo postula, mas enquanto criação da diferença, “autocriação sem instância criadora, sem finalidade que lhe dirija a trajetória e sem destino previsível”. (KASTRUP; TEDESCO; PASSOS, 2008, p.53)

A ONTOLOGIA E PRÁTICA DO COACHING ONTOLÓGICO

A ontologia, como a definimos, é a doutrina do ser, que irá indagá-lo tematicamente e discuti-lo. Temos, na frase de Humberto Maturana, a pedra angular de nossa compreensão: “tudo que é dito, é dito por um observador”, ou seja, cada expressão – seja ela por meio da linguagem ou da ação –  de um determinado sujeito, fala do observador que ele considera que é. Este assume um lugar de fala distinto das generalizações, das verdades em si e da ideia de que exista uma realidade independente dos “olhos” que a percebe e a significa.

As inquietudes humanas têm sido abordadas em cada momento histórico de formas distintas e o movimento do qual fazemos parte – o do coaching ontológico – visa abordá-las por meio da ontologia da linguagem, que tem como postulados:

– Interpretamos que os seres humanos também são seres linguísticos. Reconhecemos a linguagem como elemento central na natureza do ser humano agregada às dimensões biológica e psicológica. Esses três domínios, corpo, emoção e linguagem, estão coerentemente interligados.

– Interpretamos que a linguagem, além de descritiva, é também geradora. Podemos mesmo postular a prioridade da natureza linguística sobre a biológica e a psicológica, pois é por meio dela que conferimos significado à nossa existência, dando sentido aos domínios do corpo e da emoção. Assim, a linguagem não apenas fala das coisas. A linguagem gera o ser humano e cria realidades. Distintos mundos emergem conforme a maneira como operamos na linguagem, que é talvez o fator mais importante na definição da forma como nos vemos a nós mesmos ou somos vistos pelos outros.

– Interpretamos que os seres humanos se criam a si mesmos, na linguagem e através dela. Nossa cultura tradicional admite que cada indivíduo nasce dotado de uma forma de ser particular e imutável. A vida seria assim meramente o espaço em que essa natureza inata se revelaria.  A ontologia da linguagem assume uma posição radicalmente contrária, defendendo que a vida é o espaço em que os indivíduos criam a si mesmos. Nada é de uma forma determinada, que não permita infinitas modificações. Essa interpretação nos permite ganhar domínio sobre nossas próprias vidas, nos auto-implicando em sua construção. Esta é a proposta que nos apresenta a ontologia da linguagem.[2]

Reiteramos que uma ontologia, enquanto compreensão do que é ser humano, é a interpretação a partir da qual fazemos todas as demais interpretações, mesmo que isso, na maior parte do tempo, esteja implícito.

Por não entendermos que os seres humanos tenham um ser fixo e imutável, não-histórico ou atemporal, acreditamos que vivemos em constante e contínua produção de nós mesmos, do mundo e com o mundo. Essa compreensão faz possível que participemos da construção de um observador que atua para que suas metas se concretizem – ação comum ao coaching de forma geral.

O que se busca nas conversações de Coaching Ontológico é que juntos – coach e coachee, profissional e cliente – abram espaço para o novo, que possam criar uma realidade diferente daquela em curso, incluindo o contexto histórico, aprofundando o conhecimento de si e formulando questões sobre os temas levantados pelo coachee.

Usamos o termo “questões” no mesmo sentido que Heidegger o faz em seu livro “Ontologia”, ou seja,

[…] questões não são ocorrências; questões são tampouco “problemas” hoje em dia em uso, que “impessoalmente” assume ao acaso pelo que se ouve dizer e se lê nos livros […]. Questões surgem na discussão e confronto com as “coisas”. E coisas há aí somente onde há olhos. (HEIDEGGER, 2013, p.11)

Assim, ontologia da linguagem e, consequentemente, o coaching ontológico só podem ser encarados ao nos apropriarmos desses conceitos, caso contrário serão tratados de uma forma inaceitável a seu propósito, que é o de ampliar a envergadura de um fazer refletido e da reflexão na e para a experiência e criação de uma realidade desejada.

Nome e sobrenome se unem para que desejo e mundo fundam-se na criação de um futuro potente.

Por: Káritas Ribas

 

[1] O termo metafísica pode ter muitos sentidos. Utilizo-o, aqui, em seu sentido aristotélico, enquanto doutrina que busca a essência das coisas para além da física.

[2] Trecho retirado do texto Coaching Ontológico – O que é? – produzido pela autora em colaboração com Ana Gomes, Karla Teixeira e Iuri Barroso, publicado no Blog do Instituto Appana, acessível pelo link: https://www.appana.com.br/coaching-ontologico-o-que-e/